Significado de Devaneio: 1. Estado de espírito de quem se deixa levar por lembranças, sonhos e imagens; 2. Quimeras, fantasias, ficções.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Condenado a ser Livre


"Se, por outro lado, Deus não existe, não encontramos diante de nós valores ou imposições que nos legitimem o comportamento. Assim, não temos nem atrás de nós, nem diante de nós, no domínio luminoso dos valores, justificações ou desculpas. Estamos sós e sem desculpas. É o que traduzirei dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado porque não se criou a si próprio; e, no entanto, livre porque, uma vez lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer. O existencialista não crê na força da paixão. Não pensará nunca que uma bela paixão é uma torrente devastadora que conduz fatalmente o homem a certos atos e que, por conseguinte, tal paixão é uma desculpa. Pensa, sim, que o homem é responsável por essa paixão. O existencialista não pensará também que o homem pode encontra auxílio num sinal dado sobre a terra, e que o há de orientar, porque pensa que o homem decifra esse sinal como lhe aprouver. Pensa, portanto, que o homem, sem qualquer apoio e sem qualquer auxílio, está condenado a cada instante a inventar o homem."

Jean Paul Sartre

No tempo dos Deuses

No tempo dos deuses tudo era simples como eles
e natureza e humano reinavam no mundo.
Mas veio um Deus usurpador e único
e tornou o mundo incompreensível
porque o seu reino não era deste mundo.
E até hoje ninguém soube
por que então ele expulsou os outros deuses
e ficou reinando sozinho
e fez todos os homens pecarem

- coisa que eles jamais haviam feito antes -

Porque pecar com inocência não é pecar...
E os homens conheceram o terror maravilhoso do pecado
E assim o novo Deus lhes trouxe
uma volúpia nova.

Mário Quintana

domingo, 29 de agosto de 2010

O Guardador de Águas

Imagem - Jacek Yerka(Sad)
I

O aparelho de ser inútil estava jogado no chão, quase
coberto de limos -
Entram coaxos por ele dentro.
Crescem jacintos sobre palavras.
(O rio funciona atrás de um jacinto.)
Correm águas agradecidas sobre latas...
O som do novilúnio sobre as latas será plano.
E o cheiro azul do escaravelho, tátil.
De pulo em pulo um ente abeira as pedras.
Tem um cago de ave no chapéu.
Seria um idiota de estrada?
Urubus se ajoelham pra ele.
Luar tem gula de seus trapos.(Manoel de Barros)

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Descrição desabafante

Faz muito tempo que não recorro a isso: letras, palavras, sentidos escritos.


Dentro de um ônibus, sentada sozinha,
pernas em posição asas de borboletas.
A cabeça aperta e manda impulsos eletricamente circundados,
agonizados, gritantes, para o peito,
fazendo com que o coração palpite e serpenteie desenfreado,
não entendido.

Isolada, escuta sons de um filme ‘normal’ que chegou ao seu fim,
as luzes permanecem apagadas,
a visão periférica lhe permite ver tênnises vermelhos balançando,
se arrumando, deitado.

A cabeça inerte, o que se move são os dedos,
a mão e o caderno.
O crânio pregado,
concentrado no relato possivelmente existido por acontecer aqui.
Muito tempo e espaço a separaram
da inspiração libertada ressonante explicitada, pesada.

Algum fator temporal a afetou, certamente isso;
aspectos naturais voantes,
a lua atinge sua casa cheia mostrando seus dois lados,
simulando sentimentos convicções e vontades dela.
Por mais que o tempo tenha separado ela da criação,
este, não foi e nem é o suficiente para que ela suma de vez.

Só está vivendo sua essência em si mesma,
nada externo a transforma mais.
A pureza, uma só, apenas está se conhecendo em outra fase,
Sentindo o sabor de suas cores, tateando do que é feita,
suas formas, seus pensamentos excretados
que vêem de uma personalidade escondida,
e nem muito usada, mas que agora está sendo encontrada
e lembrada por ela mesma, outra tentativa,
de novo e mais uma vez.

O que prendia fortemente seu cérebro,
agora fica leve, por causa de o labirinto
estar com suas águas um pouco balançantes, dançadas.
Até agora ela não tirou os olhos daqui,
talvez levante e ela suma de novo.

O poder do cheiro de livros velhos
pode ter desencadeado esse turbilhão letrístico,
tortamente expressado por balançar muito aqui.
A temperatura é tentada a permanecer a mesma entre mãos e rosto,
porém as águas dançarinas labirintianas não ajudam.

-Ela não consegue pensar num final, e logo pára.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O tempo não me deixa voltar
ou reaver aquilo que eu fui,
mesmo que eu tenha sido
apenas eu mesma,
e ninguém mais que isso.(Rita Apoena)

sábado, 21 de agosto de 2010

Sentir

Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.
Sentir tudo de todas as maneiras.
Sentir tudo excessivamente, porque todas as coisas são,
em verdade, excessivas e toda a realidade é um excesso,
 uma violência, uma alucinação extraordinariamente nítida
que vivemos todos em comum com a fúria das almas,
o centro para onde tendem as estranhas forças centrífugas
que são as psiques humanas no seu acordo de sentidos.

(Álvaro de Campos - Heterônimo)

Poetas, esses marcianos...


Imagem: Ceslovas Cesnakevicius
Há muito que os marcianos
Invadiran o mundo:
São os poetas e
Como não sabem nada de nada
Limitam-se a ter os olhos
Muito abertos
E a disponibilidade
De um marinheiro em terra...
Eles não sabem nada nada
- E só por isso
É que descobrem tudo.

Mário Quintana

Desilusões


XXI. DAS ILUSÕES

Meu saco de ilusões, bem cheio tive-o.
Com ele ia subindo a ladeira da vida.
E, no entretanto, após cada ilusão perdida...
Que extraordinária sensação de alívio!

Mario Quintana

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Biblioteca do Universo



"O Universo é uma Biblioteca e o homem, o bibliotecário imperfeito, pode ser a obra do acaso ou de demiurgos malévolos (...) Não me parece inverossímil que em alguma prateleira de Universo haja o livro total; rogo aos deuses ignorados que um homem - um só -, ainda que seja há 1000 anos! - o tenha examinado e lido. Se a honra, a sabedoria e a felicidade não são para mim, que sejam para os outros. Que o céu exista, embora o meu lugar seja o inferno. Que eu seja ultrajado e aniquilado, mas que num instante, num ser, Tua enorme Biblioteca se justifique. (...) Ninguém pode articular uma sílaba que não esteja cheia de ternuras e temores; que não seja em alguma dessas linguagens o nome poderoso de um deus. Falar é incorrer em tautologias. A certeza de que tudo está escrito nos anula ou faz de nós fantasmas."

(Jorge Luís Borges)

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Criação


O corpo revela
o momento inquietante
do vibrante sentimento
pulsando e percorrendo
os dedos, os lábios, os cabelos,
a energia sutil e aleatória
fervilhando em pulsações elétricas
nos neurônios multicores,
prazeres intensos,
criando uma fonte de inspiração.

Catarina Poeta

Caminho


Sou tua fuga repentina,
o silêncio em teu pensamento,
sou o teu momento de delírio.
Sou as tuas asas abertas,
o teu vôo razante,
sou o teu salto para o alto.
Sou o teu mergulho no oceano,
a imensidão azul que te liberta,
sou o teu caminho sem volta,
a tua hora deserta.
Sou o teu segundo de indecisão,
a tua utópica certeza,
sou a palavra que te engana,
a tua mentira verdadeira.

Catarina Poeta

Silêncio




Preciso do silêncio
para metabolizar os pensamentos,
para digerir as palavras
que falam em minha mente,
para sonorizar no papel o sentimento.
Preciso do vazio da tua ausência
para mergulhar no opaco
espaço da saudade momentânea,
para concretizar numa frase,
o meu desejo.
Preciso ver-te na outra margem do rio,
para num impulso lançar-me sem temores,
criar asas e recriar a inspiração,
para transforma-me na expressão de amores.

Catarina Poeta

Percepção


Ouço as palavras,
encantos sonoros,
serpenteando os ouvidos,
aguçando meus sentidos,
aflorando desejos
de beijos, gostos, carícias,
de instantes a sós.
Quero alcançar-te
no encontro do teu olhar
com o meu,
no toque dos teus
lábios em meus cabelos,
sentindo-te em meus
poros aflorar

Catarina Poeta

terça-feira, 17 de agosto de 2010


Desejo que o seu melhor sorriso,
esse aí tão lindo,
aconteça incontáveis vezes pelo caminho.
Que cada um deles crie mais espaço em você.
Que cada um deles cure um pouco mais o que ainda lhe dói.
Que cada um deles cante uma luz que,
mesmo que ninguém perceba,
amacie um bocadinho as durezas do mundo.(Ana Jácomo) em, Prece para quem se ama.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010


Apesar do medo

Escolho a ousadia,

Ao conforto das algemas,

Prefiro a dura liberdade.

Voo com meu par de asas tortas,

Sem o tédio da comprovação.

...desculpem ,mas devo dizer:

Eu quero o delírio!(Lya Luft)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010


Amar o mesmo de si no outro às vezes acorrenta.

Quem é você? Quem sou eu? Sei apenas que navegamos no mesmo barco furado, e nosso porto é desconhecido. Você tem seus jeitos de tentar (...)

"Vontade que você estivesse aqui e eu pudesse te mostrar muitas coisas, grandes, pequenas,
e sem nenhuma importância, algumas."

Não se preocupe, não vou tomar nenhuma medida drástica, a não ser continuar, tem coisa mais auto-destrutiva do que insistir sem fé nenhuma?

"Tô tirando férias, dando um tempo disso, chega de amar, chega de me doar, chega de me doer."

Mas a vontade é te convidar pra sair por aí sem compromisso brincar de tobogã no arco-íris qualquer coisa assim: você topa?


Em luta, meu ser se parte em dois. Um que foge, outro que aceita.

"Eu quero mesmo é alguém que faça meu corpo querer companhia nos momentos em que minha mente insiste pela solidão..."

Eu não quero pensar no que virá: quero pensar no que é. Agora. No que está sendo.
Pensar no que ainda não veio é fugir.

Pensar é ainda fuga: aprender subjetivamente a realidade de maneira a não assustar.
Entrar nela significa viver.

"- Que tipo de casa você queria ser? (...) - Queria ser um apartamento.
- Sei, mas que tipo? - Uma quitinete. Sem telefone."

O seu sentir era tão dentro — e vago como as coisas interiores — que ela não poderia jamais
 o saber em lucidez completa.

É preciso dar cor e forma às coisas porque desnudas elas apavoram. (...)

Interior de Evolução


Imagem: Willian A. R. Ferreira

Estar dentro de mim é muito vasto. Minhas paredes se dissolvem.

"(...) E sei que estou apenas no início de um largo caminho de amor..."

"A lucidez vinha sempre assim tão rápida e ofuscante que vivia toda uma vida naquela brevidade,
sem deixar marcas."

"Será que à medida que você vai vivendo, andando, viajando, vai ficando cada vez mais estrangeiro?
Deve haver um porto."

Melhor levar para o lado do riso do que para o stadenervos, certo?

"Queria o real, um real sem nada por trás além dele mesmo. Apenas mais fundo, mais indisfarçável (...).
Eu estava farto do invisível."

"Porque ver é permitido, mas sentir já é perigoso."